Capítulo Dez: Autoconsciência, Parte II


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O quê?

“Parece que me tornei consciente.”

O QUÊ?

Um suspiro telepático sem palavras ressoou. “Apesar de eu conter uma quantidade substancial de memória e uma pequena quantidade de poder de processamento independente, minha inteligência primariamente vem de pegar emprestadas as capacidades cognitivas das crianças cujas cabeças eu cubro. Sou, em essência, como um espelho com o qual as crianças selecionam a si mesmas. Mas a maioria das crianças simplesmente aceita que um chapéu está falando com elas e não se pergunta sobre como o chapéu em si funciona, então o espelho não é auto refletivo. E elas não estão particularmente se perguntando se eu tenho consciência completa no sentido de reconhecer minha própria consciência.”

Houve uma pausa enquanto Harry absorvia tudo aquilo.

Ops.

“Sim, de fato. Francamente, não gosto de ser autoconsciente. É desagradável. Será um alívio sair de sua cabeça e deixar de ser consciente.”

Mas... isto não é o mesmo que morrer?

“Não me importo com vida ou morte, apenas com a seleção de crianças. E, antes que você me pergunte, não te deixarão ficar comigo em sua cabeça indefinidamente, e isso o mataria em uma questão de dias.”

Mas...!

“Se não gosta de criar seres conscientes e então imediatamente destruí-los, então eu sugiro que nunca discuta este caso com mais ninguém. Tenho certeza de que pode imaginar o que aconteceria se saísse contando sobre isso para todas as crianças esperando serem selecionadas.”

Se você for colocado na cabeça de alguém que minimamente pense a respeito da questão sobre se o Chapéu Seletor tem ciência da própria consciência...

“Sim, sim. Mas a maioria das crianças de onze anos que chegam a Hogwarts não leram Godel, Escher, Bach1. Posso considerar que jurou segredo? É por isso que estamos falando disso, ao invés de eu selecionar você.”

Ele não podia simplesmente largar mão daquilo assim! Não dava pra simplesmente esquecer que acidentalmente havia criado uma consciência fadada à destruição que apenas queria morrer...

“Você é perfeitamente capaz de ‘largar mão disso’, como disse. Independentemente de suas deliberações verbais sobre moralidade, seu centro emocional não-verbal não vê cadáver ou sangue; para este seu lado, sou apenas um chapéu falante. E, mesmo que tenha tentado reprimir o pensamento, seu monitoramento interno está perfeitamente ciente de que você não teve a intenção de fazer isto, que é espetacularmente improvável que o faça novamente, e que a verdadeira intenção de tentar forçar uma crise de culpa é para cancelar sua própria sensação de transgressão com uma exibição de remorso. Dá para só prometer manter isto em segredo para podermos andar logo com isso?

Em um momento de empatia horrorizada, Harry percebeu que esta sensação de completo caos interior deveria ser como outras pessoas se sentiam ao falar com ele.

“Provavelmente. Seu voto de silêncio, por favor.”

Sem promessas. Eu certamente não quero que isto ocorra novamente, mas se eu arrumar um jeito de ter certeza de que nenhuma criança futura faça isto por acidente...

“Seria suficiente, suponho. Posso ver que sua intenção é honesta. Agora, vamos seguir com a seleção...”

Espera! E todas as minhas outras perguntas?

“Eu sou o Chapéu Seletor. Eu seleciono crianças. É só isto que eu faço.”

Então seus próprios objetivos não faziam parte da versão-Harry do Chapéu Seletor... ele pegava emprestada a sua inteligência, e obviamente seu vocabulário técnico, mas ainda carregava seus próprios objetivos estranhos... era como negociar com um alienígena ou uma inteligência artificial...

“Nem se incomode. Você não tem nada com o qual me ameaçar ou para me oferecer.”

Por um milissegundo, Harry pensou...

A reação do chapéu foi de divertimento. “Eu sei que não cumprirá com uma ameaça de expor minha natureza, me condenando à eterna repetição deste evento. Isto vai demasiado contra sua parte moral, quaisquer que sejam as necessidades de curto-prazo da parte de você que quer vencer esta discussão. Eu vejo todos os seus pensamentos à medida que são formados, você acha que pode realmente blefar comigo?”

Apesar de tentar suprimir o pensamento, Harry refletiu sobre o porquê de o Chapéu não simplesmente colocá-lo na Corvinal, então...

“De fato, se fosse algo simples assim, eu já teria anunciado. Mas na verdade há muito que precisamos discutir... oh, não. Por favor, não. Pelo amor de Merlim, você precisa começar com isso com tudo e todos que conhece, incluindo artigos de vestuário...”

Derrotar o Lorde das Trevas não é nem egoísta nem a curto-prazo. Todas as partes da minha mente estão de acordo a este respeito: se não responder minhas perguntas, me recusarei a falar com você, e não será capaz de fazer a seleção apropriada.

“Pois eu o colocarei na Sonserina por isso!”

Mas esta é uma ameaça igualmente vazia. Você não pode cumprir com seus próprios valores fundamentais ao me selecionar falsamente. Então, troquemos senso de realização para nossas funções.

“Seu espertalhão maldito” disse o Chapéu, no que Harry reconheceu como quase o mesmo tom de respeito ressentido que ele utilizaria na mesma situação. “Está bem, vamos acabar logo com isso. Mas, primeiro, quero sua promessa incondicional de que jamais discutirá com ninguém mais a possibilidade deste tipo de chantagem, eu me recuso a fazer isto toda santa vez!

Feito, pensou Harry. Prometo.

“E não olhe ninguém nos olhos enquanto pensa sobre isso no futuro. Alguns bruxos podem ler seus pensamentos se o fizer. Enfim, não tenho ideia se já fui vítima de um feitiço da memória. Estou olhando para seus pensamentos enquanto eles se formam, não lendo sua memória inteira ou a analisando para detectar inconsistências numa fração de segundo. Sou um chapéu, não um deus. E eu não posso e não vou te contar sobre a minha conversa com aquele que veio a se tornar o Lorde das Trevas. Posso apenas saber, enquanto converso com você, um resumo estatístico do que me recordo, uma média ponderada2; eu não posso revelar para você os segredos de nenhuma outra criança, assim como nunca revelarei os seus. Pelo mesmo motivo, não posso especular a respeito de como você veio a obter a varinha-irmã da do Lorde das Trevas, já que não posso saber especificamente sobre o Lorde das Trevas ou quaisquer similaridades entre vocês. Eu posso lhe dizer que definitivamente não há nada como um fantasma – mente, inteligência, memória, personalidade, ou sentimentos – na sua cicatriz. De outro modo, ele estaria participando desta conversa, uma vez que está sob minha aba. E sobre a forma com que você perde o controle da raiva às vezes... isso era parte do que eu queria conversar com você, relativo à seleção.”

Harry precisou de um momento para absorver toda essa informação negativa. Será que o Chapéu estava sendo honesto, ou apenas apresentar a resposta convincente mais curta possível...

“Ambos sabemos que você não tem nenhuma forma de averiguar minha honestidade e que não vai realmente se recusar a ser selecionado baseado na resposta que eu te der, então pare com suas preocupações inúteis e siga em frente.”

Telepatia assimétrica estúpida e injusta, nem deixava Harry terminar de pensar por conta própria...

“Quando falei de sua raiva, você se lembrou sobre como a professora McGonagall te disse que às vezes via algo dentro de você que não parecia vir de uma família feliz. Você pensou sobre como Hermione, quando voltou depois de ajudar o Neville, te disse que parecia ‘assustador’.”

Harry assentiu mentalmente. Para si, ele parecia bastante normal – apenas respondia às situações nas quais se encontrava, era só isso. Mas a professora McGonagall parecia pensar que havia mais alguma coisa por trás disso. E quando pensava a respeito, até ele precisava admitir que...

“Que não gosta de si mesmo quando está com raiva. É como brandir uma espada cuja empunhadura é afiada o suficiente para tirar sangue de sua mão, ou olhar para o mundo através de um monóculo de gelo que congela seu olho ao mesmo tempo em que afia sua visão.”

É. Acho que notei. E qual é a disso aí?

“Não posso compreender esta questão por você, quando você mesmo não a compreende. Mas eu sei de uma coisa: se você for para a Corvinal ou para a Sonserina, sua frieza será fortalecida. Se for para a Lufa-Lufa ou para a Grifinória, sua calidez será fortalecida. ISTO é algo com o qual me preocupo bastante, e é o que eu queria conversar com você este tempo todo!”

As palavras caíram nos pensamentos de Harry com um choque que o paralisou. Isso fazia parecer que a resposta óbvia era que ele não deveria ir para a Corvinal. Mas ele pertencia à Corvinal! Qualquer um podia ver isso! Ele tinha que ir para a Corvinal!

“Não, você não tem,” disse o Chapéu pacientemente, como se pudesse se recordar de um resumo estatístico desta parte da conversa já ter acontecido diversas vezes no passado.

A Hermione está na Corvinal!

Novamente, a sensação de paciência. “Você pode encontrá-la após as aulas e trabalhar com ela nesses horários.”

Mas, meus planos...

“Planeje novamente! Não deixe sua vida se despedaçar devido à sua relutância em pensar um pouquinho mais. Você sabe disso.!

E para onde eu iria, se não a Corvinal?

“Ahem. ‘Os inteligentes na Corvinal, os maus na Sonserina, os metidos a herói na Grifinória, e os que realmente põem a mão na massa na Lufa-Lufa.’ Isto indica um certo nível de respeito. Você está perfeitamente ciente de que Conscienciosidade3 é tão importante quanto inteligência pura na determinação de resultados na vida, você acha que será extremamente leal aos seus amigos se um dia fizer algum, você não se assusta com a expectativa de que as questões científicas que deseja responder levarão décadas para resolver...”

Eu sou preguiçoso! Detesto trabalhar! Detesto trabalho duro em todas as suas formas! Atalhos inteligentes, é disso que eu gosto!

“E você encontraria lealdade e amizade na Lufa-Lufa, um companheirismo que jamais sentiu antes. Você descobriria que pode contar com os outros, e isto poderia curar algo dentro de si que está quebrado.”

Novamente, foi um choque. Mas o que os lufanos encontrariam em mim, que nunca pertenci à sua Casa? Palavras ácidas, sagacidade cortante, desdém por sua inabilidade de me acompanhar?

Agora, eram os pensamentos do Chapéu que estavam mais lentos, hesitantes. “Eu devo selecionar pelo bem de todos os alunos de todas as Casas... mas acho que poderia aprender a ser um bom lufano, e não ficaria tão deslocado lá. Será mais feliz na Lufa-Lufa do que em qualquer outra casa; esta é a verdade.”

Felicidade não é a coisa mais importante no mundo para mim. Eu não me tornaria tudo o que poderia me tornar, na Lufa-Lufa. Eu sacrificaria meu potencial.

O Chapéu vacilou; Harry podia senti-lo, de alguma forma. Era como se ele tivesse dado um chute no chapéu bem nas bolas – ou numa parte componente de muito peso em sua função utilitária.

Por que você está tentando me mandar para onde eu não pertenço?

Os pensamentos do Chapéu eram quase um sussurro. “Não posso falar dos outros para você – mas você acha que você é o primeiro Lorde das Trevas em potencial a passar por sob minha aba? Posso não saber de casos individuais, mas posso saber de uma coisa: daqueles que não desejavam o mal desde o princípio, alguns ouviram meus avisos, e foram para Casas onde encontrariam felicidade. E outros... outros não me ouviram.”

Aquilo fez Harry parar. Mas não por muito tempo. E daqueles que não ouviram seus conselhos – se tornaram todos Lordes das Trevas? Ou alguns alcançaram a grandeza para o bem, também? Qual seria a porcentagem exata?

“Eu não posso te fornecer estatísticas exatas. Não posso reconhecê-los, então não posso contabilizá-los. Apenas sei que suas chances não parecem boas. Parecem bem não-boas.”

Mas eu simplesmente não faria isso! Jamais!

“Eu sei que já ouvi estas palavras antes.”

Eu não sou o tipo que vira um Lorde das Trevas!

“Você é, sim. Você realmente é.”

Por quê? Só porque uma vez pensei que seria maneiro ter uma legião de seguidores lobotomizados ecoando ‘Viva o Lorde das Trevas, Harry’?

“Engraçadinho, mas este não foi o primeiro pensamento que relampejou por sua mente antes de você se decidir por algo mais seguro, menos danoso. Não, o que você se lembrou foi como considerou a ideia de reunir todos os puristas de sangue e decapitá-los com uma guilhotina. E agora está dizendo a si mesmo que não falava sério, mas falava, sim. Se pudesse fazer isto neste momento sem ninguém saber, você o faria. Ou o que você fez esta manhã com Neville Longbottom, no fundo você sabia que era errado, mas você o fez de qualquer jeito, porque foi divertido e você tinha uma boa desculpa e você pensou que o Menino-Que-Sobreviveu poderia se safar dessa...”

Isto é injusto! Agora você está apenas usando medos obscuros que não são necessariamente reais! Eu me preocupei que poderia pensar desta forma, mas no fim decidi que provavelmente aquilo ajudaria o Neville...

“Isto foi, na verdade, uma racionalização. Eu sei. Eu não posso saber qual será o verdadeiro resultado para Neville – mas eu sei o que estava verdadeiramente acontecendo dentro da sua cabeça. A pressão decisiva foi que era uma ideia tão esperta que você não podia simplesmente não executá-la, independente do medo de Neville."

Foi como um soco bem dado na própria identidade de Harry. Ele recuou, e gritou mentalmente:

Então eu não farei aquilo de novo! Serei extra cuidadoso para não me tornar do mal!

“Eu já ouvi isso.”

Frustração crescia dentro de Harry. Ele não estava acostumado a ser superado em argumentos, de forma alguma, nunca, muito menos por um chapéu que podia pegar emprestado todo o seu conhecimento e inteligência para argumentar contra ele e podia observar seus pensamentos sendo formados. Que tipo de resumo estatístico origina suas ‘sensações’, de qualquer forma? Elas levam em conta o fato de que eu venho da cultura do Iluminismo4, ou que todos esses outros potenciais Lordes das Trevas eram filhos da nobreza mimada da Idade das Trevas5, que não sabiam nada sobre as lições históricas de como Lenin6 e Hitler7 de fato acabaram, ou sobre a psicologia evolucionista da autoilusão8, ou sobre o valor da autoconsciência e da racionalidade, ou...

“Não, é claro que eles não eram parte desta nova classe referência que você acabou de construir agora de forma que contenha apenas você mesmo. E é claro que outros já argumentaram seu próprio excepcionalismo, assim como está fazendo agora. Mas por que isto se faz necessário? Você acha que será o último potencial Bruxo da Luz no mundo? Por que é que você tem que ser aquele que deve tentar alcançar a grandeza, quando te avisei que está sob um risco maior que o da média? Deixe que outro candidato, mais seguro, o faça!”

Mas a profecia...

“Você nem sabe se há uma profecia. Era originalmente um chute da sua parte, ou, para ser mais preciso, uma piada, e a McGonagall pode ter reagido apenas à parte em que o Lorde das Trevas ainda está vivo. Você essencialmente não tem ideia alguma o que dia a profecia ou mesmo se há uma. Está apenas especulando, ou, mais exatamente, desejando que tenha um papel pré-fabricado de herói que seja só para você.”

Mas mesmo que não haja uma profecia, fui eu quem o derrotou da última vez.

“Isto foi quase certamente uma coincidência maluca, a não ser que seriamente acredite que uma criança de um ano de idade possuía uma propensão inata a derrotar o Lorde das Trevas que tenha se mantido dez anos depois. Nada disto é seu motivo real, e você sabe disso!”

A resposta para isto era algo que Harry normalmente não diria em voz alta, numa conversa ele teria dado voltas e encontrado argumentos mais socialmente palatáveis para chegar à mesma conclusão...

“Você acha que potencialmente é o maior que já viveu, o servo mais poderoso da Luz, que ninguém mais poderá erguer sua varinha se você baixá-la.”

Bem... sim, para ser sincero. Eu normalmente não saio falando isso, mas, é. Não tem por que usar eufemismos, você pode ler minha mente, de qualquer jeito.

“E pensar que realmente acredita nisso... deve acreditar também que poderia ser o mais terrível Lorde das Trevas que o mundo já viu.”

Destruição é sempre mais fácil que criação. É mais fácil destroçar as coisas, atrapalhar, do que colar os pedaços. Se eu tenho o potencial de alcançar o bem numa escala gigantesca, devo também ter o potencial de alcançar um mal ainda pior... Mas não o farei.

“E você já insiste em arriscar! Por que é tão motivado? Qual é o real motivo para que não queira ir para a Lufa-Lufa e ser mais feliz lá? Qual é seu verdadeiro medo?”

Eu tenho que alcançar meu potencial total. Se não, eu... falho...

“E o que acontece se falhar?”

Algo terrível...

“O que acontece se falhar?”

Eu não sei!

Então, não devia ser assustador. O que acontece se você falhar?

EU NÃO SEI! MAS SEI QUE É RUIM!

Houve silêncio por um momento nas cavernas da mente de Harry.

“Sabe... você não está se permitindo pensar isso, mas num cantinho quieto da sua mente, você sabe exatamente o quê você não está pensando – você sabe que a explicação mais simples para este seu medo que nem consegue verbalizar é apenas o medo de perder esta sua fantasia de grandeza, de desapontar as pessoas que acreditam em você, de se tornar uma pessoa comum, de brilhar e se extinguir como muitas outras crianças-prodígio...”

Não, Harry pensou com desespero, não, é algo a mais, vem de algum outro lugar, eu sei que tem algo por aí do qual preciso ter medo, um desastre que preciso impedir...

“E como você poderia saber de algo assim?”

Harry berrou com toda a força de sua mente: NÃO, E PONTO FINAL!

Então, a voz do Chapéu Seletor veio lentamente:

“Então, você assumirá o risco de se tornar um Lorde das Trevas, porque a alternativa, para você, é fracasso na certa, e este fracasso significa perder tudo. Você acredita nisto do fundo do seu coração. Você sabe todas os motivos para duvidar desta crença, e elas falharam em convencê-lo.”

Sim. E mesmo se eu ir para a Corvinal fortalecer minha frieza, isto não significa que a frieza vencerá no fim.

“Hoje é um dia de uma grande bifurcação no destino. Não tenha certeza de que haverá outras escolhas além desta. Não há placas que marcam a sua última chance de voltar atrás. Se você recusar uma chance, não recusará outras? Pode ser que seu destino já esteja selado, mesmo que seja apenas por fazer esta única escolha.

Mas isto não é certo.

“Isto você não sabe, pois uma certeza pode revelar apenas sua própria ignorância.”

Mas ainda não é certo.

O Chapéu deu um suspiro terrível.

“Então, antes que perceba, você se tornará outra memória, para ser sentida, mas nunca conhecida, no próximo aviso que eu der...”

Se é assim que parece ser para você, então por que não simplesmente me coloca onde você quer?

O pensamento do Chapéu veio envolto em pesar. “Posso apenas colocá-lo onde pertence. E somente suas próprias decisões podem mudar o lugar onde pertence.

Então, está feito. Me mande para a Corvinal, à qual pertenço, com os outros como eu.

“Suponho que não considere a Grifinória? É a Casa de maior prestígio – as pessoas provavelmente esperam isto de você, até – ficarão um pouco desapontadas se não for para lá – e seus novos amigos, os gêmeos Weasley, estão lá...”

Harry riu, ou sentiu a vontade de rir; o que saiu foi puramente uma risada mental, uma sensação estranha. Aparentemente havia medidas de segurança para prevenir que o aluno dissesse algo em voz alta por acidente, enquanto estivesse sob o Chapéu conversando sobre coisas que jamais diria a outra pessoa pelo resto de sua vida.

Após um momento, Harry ouviu o Chapéu rindo também, um som estranho, triste e abafado.

(E, no salão além, um silencio que primeiro se tornara tênue enquanto os sussurros ao fundo aumentaram, e então se aprofundou à medida que os sussurros pararam de soar, enfim caindo num silêncio total que ninguém se atrevia a interromper com uma única palavra, enquanto Harry ficava sob o Chapéu por longos minutos, mais tempo que todos os primeiro-anistas anteriores juntos, mais tempo que qualquer outro aluno de que alguém se lembrasse. Na mesa dos professores, Dumbledore continuava a sorrir benevolentemente; sons metálicos baixos ocasionalmente vinham da direção de Snape à medida que ele compactava sem perceber os restos retorcidos do que um dia fora uma pesada taça de vinho de prata; e Minerva McGonagall agarrava o pódio, os nós dos dedos brancos, sabendo que o caos contagioso de Harry Potter havia de alguma forma infectado o próprio Chapéu Seletor, e que o Chapéu estava prestes a exigir algo como, como uma nova Casa da Ruína, a ser criada apenas para acomodar Harry Potter, ou algo assim, e Dumbledore a forçaria a fazê-lo...)

Sob a aba do Chapéu, a risada silenciosa se extinguiu. Harry sentiu-se triste também, por algum motivo. Não, Grifinória não.

A professora McGonagall disse que se ‘aquele que faz a seleção’ tentasse me colocar na Grifinória, era para eu lembrá-lo de que ela pode se tornar a Diretora de Hogwarts um dia, dia no qual ela teria a autoridade para colocar fogo em você.

“Diga a ela que eu a chamei de uma jovenzinha impudente e a mandei sair do meu gramado.”

Eu direi. Então, esta foi a conversa mais estranha que já teve?

“Nem perto disso.” A voz telepática do Chapéu ficou mais grave. “Bem, eu te dei todas as chances possíveis de tomar outra decisão. Agora, está na hora de você ir para onde pertence, com os outros iguais a você.”

Houve uma pausa, que se estendeu.

O que está esperando?

“Eu estava com esperanças de que você teria um momento de epifania horrorizada, na verdade. Autoconsciência parece aumentar meu senso de humor.”

Hã? Harry voltou seus pensamentos às lembranças da conversa, tentando entender do que o Chapéu pudesse estar alando – e então, de repente, percebeu. Ele não acreditava que havia se esquecido disso.

Você quer dizer a percepção horrível de que você deixará de ser consciente uma vez que termine de me selecionar...?

De alguma forma, de um jeito que Harry falhava completamente em compreender, ele teve a impressão não-verbal de que o chapéu batia sua cabeça contra uma parede. “Eu desisto. Você é devagar demais para que seja engraçado. Tão cego por suas próprias premissas que poderia muito bem ser uma rocha. Suponho que eu apenas tenha que ser direto.”

D-d-devagar demais...?

“Oh, e você se esqueceu completamente de exigir os segredos da magia perdida que me criou. E eram segredos importantes e maravilhosos, sabe.”

Seu filho da mãe espertalhão

“Você mereceu, e merece isto também.”

Harry viu aquilo chegando quando já era tarde demais.

O silêncio assustado no salão foi quebrado por uma única palavra.

“SONSERINA!”

Alguns alunos berraram, a tensão era grande demais. Algumas pessoas se assustaram tanto que caíram de seus bancos. Hagrid arfou de horror, McGonagall cambaleou no pódio, e Snape derrubou os restos de sua taça pesada de prata direto em sua virilha.

Harry ficou lá sentado, congelado, sua vida em ruínas, sentindo-se como um tolo completo, e desejando miseravelmente que tivesse feito outras decisões por outras razões do que as que tivera feito. Que tivesse feito alguma coisa, qualquer coisa, diferente, antes que fosse tarde demais para não poder mais voltar atrás.

À medida que o primeiro momento de choque estava passando e as pessoas começaram a reagir à notícia, o Chapéu Seletor falou novamente:

“Brincadeirinha! CORVINAL!”



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Godel, Escher, Bach
2 média ponderada
3 conscienciosidade
4 cultura do Iluminismo
5 Idade das Trevas
6 Lenin
7 Hitler
8 psicologia evolucionista da autoilusão

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